sexta-feira, 27 de abril de 2007

Nem tudo é solidão

Reagindo a um texto de João, em seu blog, um texto que é um grito - não um apelo desesperado por ajuda, mas a expressão de uma vontade profunda de ajudar -, um grito bastante eloqüente, César escreveu um comentário à altura. Compartilho aqui, por achar que as reflexões feitas em ambos os textos são tão necessárias quanto são urgentes. (O desenho ao lado é de Rodolfo Mesquita).

Cesar said...

Belo texto. Bom saber que nem tudo é solidão, e quando se grita na multidão, umas cinco pessoas se voltam pra você e se identificam com sua dor. Esse clima de apatia política da sociedade de consumo faz sentido em sociedades pós-industriais, onde os conflitos sociais foram abafados e conciliados pela umbrela do estado do bem estar social e por uma sensação de prosperidade e afluência generalizada. Incompreensível que esse mesmo sentimento assole a juventude de classe média do Brasil, país ainda enredado num violento apartheid social, onde só em Pernambuco 4000 pessoas são assassinadas por ano e onde muitas pessoas - pobres sobretudo - vivem em estado de sítio, sem liberdade de ir e vir em suas comunidades dominadas pelo crime, sem direito à educação e à saúde. É mais fácil e mais romântico lutar contra generais puritanos como Médici e Geisel do que reconhecer a falta de liberdade e democracia real na qual vivem inúmeras pessoas (pobres) no Brasil. Somos apolíticos, como se a política tivesse dado tudo o que teria a dar, quando a realidade se apresenta de outra maneira. A grande batalha é a simbólica, a batalha da linguagem, da nomeação. Falta-nos um Camus, um Beckett, alguém que diga que o absurdo é absurdo, alguém que conclame o senso de urgência e balance os corações de uma geração tão preconcemente pragmática e satisfeita com tão pouco. Vivemos numa situação absolutamente surreal: um baile alegre no salão nobre de um Titanic que afunda. Ninguém tem coragem de dizer que o rei está nu. Chamar o absurdo de absurdo. Pra isso que precisamos de gente como você, João. De artistas, de teatro. Pra nomear as coisas.

quarta-feira, 25 de abril de 2007

Liberdade para quê?

A Economist da semana passada publicou um editorial - cujo tema foi a capa da mesma edição -, analisando a mais recente, mais uma, tragédia provocada pelo acesso extremamente fácil às armas de fogo nos Estados Unidos. Trata-se de uma publicação de inequívoca tradição liberal, com autoridade moral, portanto, para fazer uma crítica à liberadade de matar.

Ao contrário do que o senso comum tende a afirmar, não concordo que ser "liberal" seja necessariamente "de direita". Os liberais, como a Economist, o são econômica e socialmente. Naquilo que chamamos "de direita", em geral nos referimos a um pensamento socialmente conservador e economicamente liberal, enquanto que "de esquerda" refere-se a uma ideologia socialmente liberal e economicamente intervencionista.

A publicação contribui para o debate sobre armas que matam, demonstra o disparate em que se transformou a discussão sobre o tema nos Estados Unidos - por força do podero lobby na National Rifle Association e comprova, uma vez mais, porque é, desde o século XIX, uma revista tão respeitada - é coerente e sensata. Num país, como o nosso, em que se mata mais, em um dia, só em uma grande metrópole, mais do que uma semana inteira de guerra no Iraque, a reflexão é mais que desejável - é uma imposição moral.

Quem quiser ler a matéria inteira (recomento), vá aqui. Coloco, abaixo, um trecho bem interessante:


"No phrase is bandied around more in the gun debate than “freedom of the individual”. When it comes to most dangerous products—be they drugs, cigarettes or fast cars—this newspaper advocates a more liberal approach than the American government does. But when it comes to handguns, automatic weapons and other things specifically designed to kill people, we believe control is necessary, not least because the failure to deal with such violent devices often means that other freedoms must be curtailed. Instead of a debate about guns, America is now having a debate about campus security."

domingo, 22 de abril de 2007

Halal power for road users of the future?

(E-mail de um amigo canadense, publicado no Financial Times)


By Daniel Roseman

Published: April 19 2007 03:00 | Last updated: April 19 2007 03:00

From Mr Daniel Roseman.

Sir, One can imagine the dialogue at the fuel pump in light of the development of alternatives to petrol ("Plan to make biodiesel from animal fat", April 12):

"Will that be vegetarian, kosher/halal, blended or classic?"

Daniel Roseman,

Ottawa, Canada K2P 0J5

Copyright The Financial Times Limited 2007

quinta-feira, 19 de abril de 2007

Enganos e desenganos

Escrito por Noé Sérgio, arquiteto, em resposta a artigo assinado por João da Costa (aqui, para assinantes UOL).


os moradores de Boa Viagem entregaram um abaixo-assinado com 17

A condução que vem sendo dada à questão do parque de Boa Viagem mostra mais uma vez a dificuldade de se conduzir de forma clara e objetiva questões que dizem respeito ao urbanismo.Há cerca de oito anos, apenas para ficar em fato mais recente, a Praça Rio Branco no Bairro do Recife foi modificada ao gosto oficial de então, ignorando práticas mais contemporâneas de gestão urbana aqui mesmo no Brasil. Embora considerando toda a evolução política e social que temos vivenciado ao longo destes primeiros anos do século XXI e até por isso, é exasperante constatar a eterna pertinência da frase do Príncipe de Salina refletindo sobre o seu tempo nas páginas de “O Leopardo”: “As coisas têm de mudar, para permanecerem do jeito que estão”.


O primeiro engano com relação à questão do Parque de Boa Viagem é a de que “os moradores de Boa Viagem entregaram um abaixo-assinado com 17 mil assinaturas ao

Presidente”. Na realidade o abaixo assinado foi colhido por uma população, não necessariamente de Boa Viagem, mobilizada em torno de um ideal comum. Assinaturas foram colhidas em toda a cidade: universidades, escolas, bares e locais de trabalho bem além dos limites do bairro.. O raio de influência imediata de um equipamento deste porte é de 1,5km. A semelhança do que acontece com espaço equivalente na cidade: o da Jaqueira, tal equipamento diz respeito a uma população que transcende em muito aquele raio. É fundamental que fique bastante claro: o pleito é de uma parcela dos cidadãos recifenses e não apenas dos moradores de Boa Viagem, Setúbal, Imbiribeira e arredores.

Assim chegamos ao segundo engano: conforme foi colocado acima não se trata de caprichos de comunidades particulares, como parece estar sendo a compreensão da gestão.Ao se mobilizar para demandar à Presidência da República uma área para a implantação de um parque, esta parcela da população tinha em mente o significado da palavra na forma como a explica o Houaiss: “terreno relativamente extenso, cercado e arborizado, destinado à recreação ou um jardim público arborizado para lazer e ornamentação”.

Ora...No dizer do próprio Niemeyer o projeto entregue é: "uma grande área ajardinada onde serão situados o teatro, o prédio de apoio com escritórios, lojas, etc. o salão de exposições, e um mirante, que, a 20 metros de altura, dará aos visitantes uma visão panorâmica extraordinária...”. Um espaço de diversão (skate, parque de diversão para crianças) e de entretenimento (shows e espetáculos culturais).Não era bem isso, o que os cidadãos que apuseram a sua assinatura naquele pedido ao presidente tinham em mente. O espaço desejado era aquele da definição de Houaiss



Um terceiro (e grave!!!) engano é aquele que vem dando uma dimensão indevida e usando o batismo do espaço de eventos ora em questão. O debate deve ser conduzido com o foco no equipamento urbano em si e como ele atende as políticas ambientais, como ele responde a questões urbanísticas e paisagísticas. A questão aqui não reside na pessoa da homenageada ou no que ela significa. Não acho que este aspecto mereça nem mesmo considerações neste momento. Não apenas pela sua pequenez, mas principalmente para que não se perca o real sentido do debate.

A questão substantiva é a imagem construída pela população em torno da palavra “parque” e o desejo decorrente e a capacidade de cognição da gestão para conseguir interpreta-la dentro de um vocabulário o mais simples e corriqueiro possível e antenar-se com os princípios mais básicos das práticas ambientalistas de grupos políticos mais evoluídos.

Se a atitude do prefeito foi antidemocrática ou não, isso só é assunto para as próximas eleições; até lá, vamos praticando democracia .

os moradores de Boa Viagem entregaram um abaixo-assinado com 17