quarta-feira, 1 de novembro de 2006

Conclusões eleitorais - desmistificações

O fim das eleições presidenciais nos permite tirar algumas conclusões. Em primeiro lugar, acho importante destacar três mitos do discurso hegemônico desfeitos:

1) O PT morreu. Esse diagnóstico taxativo foi repetido por inúmeros analistas, comentaristas, cientistas políticos e políticos. No entanto, o Partido elegeu a maior bancada da Câmara, tendo sido o partido detentor da maior fatia dos votos absolutos. Além disso, elegeu cinco governadores, incluindo aí a Bahia e o Pará. Mais do que isso, o segundo turno mostrou a força da militância petista, que contribuiu inequivocamente para as viradas como a observada aqui em Brasília - onde a votação do Presidente Lula teve um aumento de 53%. Paralelamente, PMDB, PSDB e PFL viram o número de estados que governam diminuir. O PFL sai particularmente enfraquecido, tendo perdido para o PT dois estados em que era a força hegemônica tradicional, Sergipe e Bahia. Hoje, resta-lhe o Distrito Federal - e ainda assim, sob o comando de José "Painel" Roberto "Chorão" Arruda - um oportunista, que não tem nenhum apego ao PFL ou a qualquer partido que não o seu projeto político pessoal.

2) As áreas mais eficientes do governo são as não-petistas. Apesar de esse ser o senso comum na grande imprensa corporativa, o resultado eleitoral desmente essa idéia. Os principais programas ou políticas públicas que levaram ao forte apoio popular do Presidente Lula são de ministérios comandados por petistas durante todo o governo ou a maior parte dele - Desenvolvimento Social, Educação, Cidades, Saúde, Cultura - além das políticas setoriais, como as para as mulheres e para os negros. Os dois ministérios que os setores conservadores propagavam como os mais eficientes - Agricultura e Desenvolvimento e Comércio - não figuravam entre os mais bem avaliados. Tanto que o Presidente Lula foi derrotado (ainda que por pequena margem) em todos os estados agrícolas; e a gestão Furlan, por melhor que tenha sido, não gera tantos dividendos eleitorais - tanto que o Presidente Lula não era o candidato preferido da classe empresarial.

3) A imprensa escrita e televisiva assim como as classes sociais mais altas são formadores de opinião. Houve um total descompasso entre a visão dos setores conservadores hegemônicos, expressa em seus porta-vozes midiáticos - a "opinião publicada" -, e a opinião verdadeiramente pública, do povo - expressa nas urnas. Ficou evidente o poder limitado, decadente desses setores hegemônicos. Vendo-se incapazes de exercer, paternalisticamente, a tarefa a que se acham divinamente incumbidos, os formadores de opinião dedicam-se, agora, a deformar a opinião. São os deformadores da opinião alheia. Assim, buscam várias explicações para a votação expressiva do Presidente Lula - a maior parte delas expressando viés elitista e um forte preconceito de classe. O povão mostrou sua autonomia - o caso do Maranhão é emblemático, onde o Presidente Lula obteve 85% dos votos, mas sua candidata ao governo foi derrotada. A grande imprensa, aliás, sai como uma das grandes derrotadas. Afinal, depois de mais de um ano de uma sistemática campanha de desmoralização do PT e de desestabilização do Governo Lula, tanto um quanto o outro foram consagrados nas urnas. Do lado positivo, para a imprensa, deve-se registrar a maior opção de fontes de informação disponíveis para o leitor crítico. Hoje, graças à Internet, é possível fugir ao pensamento único do oligopólio midiático, podendo-se ler desde sites abertamente esquerdistas - como o da Revista Fórum, o Blog do Zé Dirceu ou a página da Carta Maior - até aqueles mais equilibrados - como o Luís Nassif Online, o Observatório da Imprensa ou o Centro de Mídia Independente. A opção estende-se, também, à direita do espectro político, como, por exemplo, os blogs de Daniel Piza e Reinaldo Azevedo. Essa maior oferta de fontes é muito saudável e espero que se torne maior e mais acessível no futuro.

10 comentários:

Anônimo disse...

Interessante análise. Lá no meu blogue eu também tendo fazer uma análise dessa relação entre o povo e a mídia. É preciso desmistificar esse poder da mídia no Brasil. E o próprio termo "mídia", como se fosse um bloco monolítico.

Anônimo disse...

Berna, eu apenas complexificaria essa coisa da morte do PT. Acho que muitos analistas se referem a uma morte simbolica e nao apenas (meramente pragamatica em termos de disputa do poder hegemonico). Eu fico pensando na maturidade politica com a qual Lula chega para esse segundo mandato e que talvez, sem essa morte simbolica do PT, nao seria possivel. O presindente chega na sua entrevista na TV Globo e enfrenta as perguntas muitas vezes espinhosas dos apresentadores com a destreza de quem por quatro anos comeu o pao que a midia amassou. Sem utopias socialistas, diz que quer fazer um governo trabalhando com as "forcas politicas existentes no pais" o que em outros paises poderia soar como tautologia, mas que vindo dele, e aqui no Brasil, eh sinal de muitas outras coisas. Bem, queria apenas fazer esse comentario, nao num saudosismo de um antigo PT que dentro de sua diversidade parecia sonha com um socialimo distante, mas apenas para aludir a morte simbolica desse PT que existiu e que por varias razoes precisou ser assassinado, talvez, para o bem da nacao...(nao sei.) Eu acho que isso eh uma coisa importante de ser analisada, para nao virar recalque historico como outros momentos historico da esquerda, como os resultados da revolucao bolchevique, a revolucao cultural de Mao, entre outros.

Anônimo disse...

Oi, jampa!

Concordo com você que houve uma morte simbólica do PT. Inclusive que esse 2º turno proporcionou uma grande sessão psicanalítica para governo e partido. Lula captou a mensagem, vamos ver como ele toca o que precisa ser feito, em nível do governo. Em nível do partido, não sei não.... picanaliticamente falando, vai haver muita, muita resistência [e o velho Freud explica] em trabalhar essa morte simbólica, para poder reviver.
No entanto, a morte a que muitos políticos e mídia corporativa se referiram, era a morte morrida mesmo, era o ‘acabar com aquela raça’ do [com licença] borra usen ...
Esta morte, como diz berna, não se deu!

Anônimo disse...

Concordo plenamente que a maior derrota foi sim a da grande imprensa, e ela insiste em nao assumir publicamente suas posturas, o último Observatório da Imprensa mostrou isso. Os jornalistas representando suas empresas - entre elas a Folha de SP - dizendo a cobertura foi equilibrada e isenta. Os caras pregaram abertamente o ódio anti-Lula, deram um golpe baixo no primeiro turno , e ainda tem a cara de pau de pedir equilibrio a militancia de esquerda ( nao que eu concorde com a hostilidade a qualquer jornalista ou orgão). Quanta hipocrisia! Eles podem destilar um ódio pessoal e de classe mas as militâncias - pessoas que não se escondem atrás de falso biombo da neutralidade e estão lá em sua maioria por uma crença coletiva - dever manter a serenidade e o equilibrio. De certa maneira a imprensa pode ser vista ainda como um bloco monolítico, basta levar em consideraçao que 95% dos leitores/espectadores se informam por meio de menos de uma dezena de meios de comunicação, dezena essa q diz sempre a mesma coisa.

Anônimo disse...

Jampa? O que você quer dizer com morte simbólica do PT? Seria a morte daquela utopia de que o PT de fato representava algo de diferente na politica, uma REAL alternativa de poder? O que de fato vem a ser a morte simbolica do PT?


Alias, se for falar nisso, o PMDB, que ha muito morreu simbolicamente nao deixa de, eleicao apos eleicao, ser o Partido com mais deputados e governadores. Eh nesse sentido que vc estah falando de uma morte simbolica do PT?

Anônimo disse...

Cesar,

é mais ou menos nesse sentido sim. É no sentido mais psicanalítico mesmo já mencionado também acima por Anna. Vou abusar aqui do liguajar livre, mas não vejam nisso pedantismo nem impostura nos exageros. Acho que o exemplo que você dá do PMDB característico desse efeito de "fetichização"(no sentido de inversão de valor de uso pelo de troca nas finalidades políticas- de aprender a respeito da automia do poder em termos de sua manutenção, etc.) das lutas políticas dados por "morte simbólica" das utopias e a pragmatização dos partidos. O PMDB é o partido mais partido do Brasil. O maior, mais importante e dividido. Mas não se discute essas coisas. A experiência real das esquerdas quase nunca é encarada de frente. Não digo isso com saudosismo, repito. Mas acho realmente importante não passar por traumas profundos como esse(eu nasci dentro do PT e sei o que ele significava para muita gente, e não significa mais, é nesse sentido que houve morte)sem avaliação mais substantiva de suas conseqüências reais. Depois vc fica esquisofrenico (como o PMDB é)e nem sequer cogita em considerar isso como algo patológico. A morte simbólica da qual falo é a morte de um PT imaginado pelas pessoas e que os fatos desmentiram. Concordo plenamente com análise de Bernardo, o PT não morreu como uma boa parte da imprensa gostaria que assim fosse. O PT continua sendo um partido maior do que o seu campo majoritário(que continua influente e forte na disputa interna do partido) e o "campo minoritário"(os que saíram desgotosos). Mas quem votou em Lula como eu votei sabe a diferença desse voto pra outros do passado. E não pensar nas razões dessa diferença é se sujeitar ao medo de uma verdade talvez evidente e dolorosa demais para ser vista sem recalque algum. Eu acho necessário pensar nessas coisas. Acho que é isso.

Bernardo Jurema disse...

Acho que o termo "morreu" não cabe ao PT, ainda. O Partido amadureceu.

Do mesmo jeito que dizem que um empresário só se torna empresário, de fato, depois que não consegue pagar a Folha do mês, um Partido político só vira Partido depois de chegar ao Poder. A próxima gestão de Lula, bem como o período de sucessão em 2010 será um teste para o PT. Tornar-se-á um Partido político ou um Partido partido, como diz Jampa?... um Partido perdido...

Anônimo disse...

Diogo, se um partido politico soh vira partido depois de chegar no poder, como vc diz, retiro tudo o que eu disse. Nao existe dilema existencial nenhum pro PT. Ele pode jogar a sua historia (fora do poder) nos poroes do passado... E dizer um "eh soh daqui pra frente que vale!" Nao eh bem assim, neh?

Bernardo Jurema disse...

Não é isso, Jampa. Acredito que chegar ao poder transforma o Partido. Não se trata de esquecer o passado, mas de trazer o passado para o presente considerando experiências do período que governou. Não me refiro a jogar nada para "porões do passado", mas transformar velhos conceitos em novos baseado no que viveu, mesmo.

Bernardo Jurema disse...
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