Nem tudo é solidão
Reagindo a um texto de João, em seu blog, um texto que é um grito - não um apelo desesperado por ajuda, mas a expressão de uma vontade profunda de ajudar -, um grito bastante eloqüente, César escreveu um comentário à altura. Compartilho aqui, por achar que as reflexões feitas em ambos os textos são tão necessárias quanto são urgentes. (O desenho ao lado é de Rodolfo Mesquita).
Belo texto. Bom saber que nem tudo é solidão, e quando se grita na multidão, umas cinco pessoas se voltam pra você e se identificam com sua dor. Esse clima de apatia política da sociedade de consumo faz sentido em sociedades pós-industriais, onde os conflitos sociais foram abafados e conciliados pela umbrela do estado do bem estar social e por uma sensação de prosperidade e afluência generalizada. Incompreensível que esse mesmo sentimento assole a juventude de classe média do Brasil, país ainda enredado num violento apartheid social, onde só em Pernambuco 4000 pessoas são assassinadas por ano e onde muitas pessoas - pobres sobretudo - vivem em estado de sítio, sem liberdade de ir e vir em suas comunidades dominadas pelo crime, sem direito à educação e à saúde. É mais fácil e mais romântico lutar contra generais puritanos como Médici e Geisel do que reconhecer a falta de liberdade e democracia real na qual vivem inúmeras pessoas (pobres) no Brasil. Somos apolíticos, como se a política tivesse dado tudo o que teria a dar, quando a realidade se apresenta de outra maneira. A grande batalha é a simbólica, a batalha da linguagem, da nomeação. Falta-nos um Camus, um Beckett, alguém que diga que o absurdo é absurdo, alguém que conclame o senso de urgência e balance os corações de uma geração tão preconcemente pragmática e satisfeita com tão pouco. Vivemos numa situação absolutamente surreal: um baile alegre no salão nobre de um Titanic que afunda. Ninguém tem coragem de dizer que o rei está nu. Chamar o absurdo de absurdo. Pra isso que precisamos de gente como você, João. De artistas, de teatro. Pra nomear as coisas.