Não obstante as políticas neoliberalizantes implementadas pelos sucessivos governos na década de 90 e da retórica de cunho nacionalista da oposição, é forçoso reconhecer que ambas as correntes ideológicas têm fortes limitações. A explicação está no processo de formação do Estado e do sistema econômico brasileiros, que impôs restrições bastante arraigadas ao pleno desenvolvimento do liberalismo e do nacionalismo.
Quando a burguesia ascendeu na Europa, mormente após a Revolução Francesa, em fins do século XVIII, esta nova classe social tinha por objetivo organizar a sociedade sobre novas bases. Ademais, interessava-os constituir uma economia nacional integrada, e, portanto, a fidelidade do povo deveria ser à nação e não mais ao Rei. Nacionalismo e liberalismo são conseqüências diretas da necessidade de uma burguesia vigorosa, ligada ao desenvolvimento manufatureiro e industrial, e diante da aristocracia decadente, por um Estado liberal, nacional e laico.
Trazidas ao Brasil no século XIX, as duas linhas de pensamento enfrentaram alguns obstáculos. Os movimentos que as adotavam em seus discursos eram inorgânicos e ideologicamente pobres, em decorrência do atraso cultural e material da maioria da população brasileira. Acrescente-se a isso o analfabetismo do povo e a deficiência dos meios de comunicação, que dificultavam a livre circulação de idéias. A maior barreira, porém, foi a discrepância patente entre o contexto europeu, onde surgiram, e o brasileiro, para onde foram transpostos.
O Brasil, àquela época, tinha uma estrutura econômica agrária e escravista, voltada para o comércio externo, dominada pela aristocracia de origem portuguesa. A burguesia, formada majoritariamente por comerciantes portugueses, era pouco expressiva. Setores do clero, por sua vez, não hesitavam em fazer parte de movimentos revolucionários. Ademais, muitas províncias tinham mais ligações com a Europa do que entre si; os movimentos revolucionários ocorridos nos dois primeiros decênios do século XIX continham antes caráter local ou regional do que nacional. Dado este contexto, não poderia ter sido diferente: no Brasil, o liberalismo surgiu contra o sistema colonial, mas não contra a monarquia ou a Igreja; e estabeleceu-se em oposição à metrópole, ao invés de favorável à nação.
Em conseqüência, hoje, o nacionalismo é superficial, desprovido de conteúdo ou de qualquer projeto de longo prazo, baseado mais em "slogans" e símbolos - o caso mais emblemático talvez seja a campanha do petróleo nos anos 50, ou as campanhas "nacionalistas" durante a Ditadura Militar. O liberalismo econômico, por sua vez, é ambíguo, em decorrência do importante papel desempenhado, direta ou indiretamente, pelo Estado na economia brasileira - o fato de ser a estatal Petrobrás a maior empresa nacional ilustra bem o ponto. São essas bases históricas que explicam, em parte, a fluidez ideológica do confronto político no sistema partidário brasileiro até os dias de hoje e a falta de um projeto nacional por parte das elites.
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